sexta-feira, 27 de julho de 2012

BERSTEIN, Serge. "A cultura política." In: RIOUX, Jean-Pierre & SIRINELLI, Jean-François. Para uma História Cultural. Lisboa: Estampa, 1998.

- A cultura política surge como oferecendo uma resposta mais satisfatória, do que qualquer das propostas até então, quer se tratasse da tese marxista de uma explicação determinista pela sociologia, da tese idealista pela adesão a uma doutrina política, ou de múltiplas teses avançadas pelos sociólogos do comportamento e mesmo pelos psicanalistas;

- A cultura política não é uma chave universal que abre todas as portas, mas um fenômeno de múltiplos parâmetros, que não leva a uma explicação unívoca, mas permite adaptar-se à complexidade dos comportamentos humanos;

- Trata-se de "uma especie de código e de um conjunto de referentes, formalizados no seio de um partido ou, mais largamente, difundidos no seio de uma família ou de uma tradição políticas;

- A importância do papel das representações na definição de uma cultura política, que faz dela outra coisa que não uma ideologia ou um conjunto de tradições além do caráter plural das culturas políticas num dado momento da história e num dado país;

- A cultura política constitui um conjunto coerente em que todos os elementos estão em estreita relação uns com os outros, permitindo definir uma forma de identidade do individuo que dela se reclama;

- Esse conjunto se compõe de 1) uma base filosófica e doutrinal, 2) uma leitura comum do passado histórico 3)uma visão institucional 4) uma concepção ideal de sociedade 5) um discurso;

- É dizer que a cultura política supre no mesmo tempo, "uma leitura comum do passado" e uma "projeção no futuro vivida em conjunto";

- Para os historiadores, é evidente que no interior de uma nação existe uma pluralidade de culturas políticas, mas com zonas de abrangência que correspondem à área dos valores partilhados. Se, num dado momento da história, essa área dos valores partilhados se mostra bastante ampla, temos então uma cultura política dominante que faz infletir pouco ou muito a maior parte das outras culturas políticas contemporâneas. Pode-se assim, admitir que, no primeiro terço do século XX, cultura política republicana desempenhou um papel dominante;

- O nascimento da cultura política corresponde às respostas dadas a uma sociedade face aos grandes problemas e às grandes crises da sua história, respostas com fundamento bastante para que se inscrevam na duração e atravessem as gerações;

- Da nova solução que propõe à sua transformação em corrente estruturada, que provoca o nascimento de uma política normativa, o prazo pode ser muito longo;

- É necessário o espaço de pelo menos duas gerações para que uma ideia nova, que traz uma resposta baseada nos problemas da sociedade, penetre nos espíritos sob forma de um conjunto de representações de caráter normativo e acabe por surgir como evidente a um grupo importante de cidadãos;

- Além do tempo, a cristalização da cultura política se faz através das instituições: família, escola, meio de trabalho, partidos políticos e a imprensa;

- Nenhum destes vetores procede por doutrinação, não obstante, a sua multiplicidade proíbe pensar que se exerce sobre um dado individuo uma influência exclusiva. A ação é variada, por vezes contraditória, e é a composição de influências diversas que acaba por dar ao homem uma cultura política, a qual é mais uma resultante do que uma mensagem unívoca;

- A cultura política assim elaborada é difundida, á escala das gerações, não é de forma alguma uma fenômeno imóvel. É um corpo vivo que continua a evoluir, que se alimenta, se enriquece com múltiplas contribuições, as das outras culturas políticas quando elas parecem trazer boas respostas aos problemas do momento, os da evolução da conjuntura que inflete as ideias e os temas, não podendo nenhuma cultura política sobreviver a prazo a uma contradição demasiado forte com as realidades;

- Mas a evolução das culturas políticas não resulta apenas de uma adaptação necessária a circunstâncias forçosamente mutáveis. Ela depende também da influência que possam exercer as culturas políticas vizinhas, na medida em que estas parecem trazer respostas baseadas nos problemas que se deparam às sociedades num dado momento da sua evolução;

- A verdadeira aposta está em compreender as motivações que levam ao homem a adotar este ou aquele comportamento político;

- A força da cultura política como elemento determinante do comportamento do individuo resulta, em primeiro lugar, da lentidão e da complexidade da sua elaboração. Adquirida no decurso da formação intelectual, beneficia do caráter de certeza das primeiras aprendizagens;

- Se a cultura política retira a sua força do fato de, interiorizada pelo individuo, determinar as motivações do ato político, ela interessa ao historiador por ser, em simultâneo, um fenômeno coletivo, partilhado por grupos inteiros que se reclamam dos mesmo postulados e viveram as mesmas experiências;

- Passando da dimensão individual a coletiva da cultura política, esta fornece uma chave que permite compreender a coesão de grupos organizados à volta de uma cultura;

- Fator de comunhão dos seus membros, ela fá-los tomar parte coletivamente numa visão comum do mundo, numa leitura partilhada do passado, de uma perspectiva de futuro, em normas, crenças, valores que constituem um patrimônio indiviso, fornecendo-lhes, para exprimir tudo isto, um vocabulário de símbolos, gestos, até canções que constituem uma verdadeiro ritual;

- A cultura política revela um dos interesses mais importantes da história cultural, o de compreender as motivações dos atos dos homens num momento da sua história, por referência ao sistema de valores, de normas, de crenças que partilham, em função da sua leitura do passado, das suas aspirações para o futuro, das suas representações da sociedade, do lugar que nem têm e da imagem que têm da felicidade.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

REIS FILHO, Daniel Aarão. "O colapso do colapso do populismo ou a propósito de uma herança maldita" In: FERREIRA, Jorge (Org.). O populismo e sua história: debate e crítica . Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.

O Colapso de uma República

I - A movimentação inicial das tropas do General Mourão Filho, ainda que sem um movimento de ação total de toda a cúpula conspiradora, mas que a medida que a organização da resistência por parte do presidente João Goulart se perdia gradualmente, os golpistas conseguiam, pouco a pouco, a destruição da experiência democrática empreendida duas décadas antes. Em contrapartida, as movimentações dos grupos sociais de oposição, sofriam uma derrota ultrajante nas suas expectativas que, desde a "conquista" da posse de Jango no Plebiscito, vinham num crescendo em relação as Reformas de Base;

II - A conjuntura que se abriria com a renúnica de Quadros e a articulação golpista no sentido de tentar barrar a posse de Jango desembocou na mobilização empreendida por Leonel Brizola - a Rede da Legalidade - que tendo em vista garantir o cumprimento Constitucional, e assegurar a posse de Jango -  se transfigurou no principal movimento de oposição à articulação golpista em 1961. No entanto, a análise de que o êxito desta campanha se justificou a medida que ele se pautava em garantir a ordem constitucional frente ao ataque dos setores conservadores;

III - A partir desta "vitória" os movimentos sociais intensificaram a sua campanha pela realização das reformas de base. Segundo Reis, calculando mal as condições que os fizeram ter sucesso na Campanha da Legalidade. Reis aponta que a euforia da vitória tenha "cegado" esses movimentos, fazendo com as suas posições se radicalizassem cada vez mais. O grande número de greves e as constantes crises no governo federal fizeram os golpistas de 61 se colocarem na defensiva, temendo que caso as reformas fossem levadas a frente, as sérias transformações pelas quais poderia passar a estrutura social brasileira.Toda uma mobilização dos setores liberais, eclesiais e militares adotavam uma postura anticomunista como forma de barrar a "República Sindicalista" para qual o Brasil estava caminhando.

IV - Depois de reaver os seus poderes presidenciais, Goulart viu naufragar o seu Plano Trienal. No primeiro de um série de comícios que serviriam como forma de pressionar o Congresso Nacional a aprovar as Reformas de Base, cruzou o limite a linha média vacilante a qual adotara até então. 

V - Ao sucesso do primeiro comício pelas reformas, a reação dos setores conservadores veio com a realização da "Marcha da Família com Deus pela Liberdade". O desfecho viria com a participação de Goulart em dois eventos reunindos subalternos das forças armadas. O que viria a ser o seu ultimo discurso numa reunião de sargentos da PM no Rio, foi o estopim do movimento de 31 de março de 1964.
Colapso do Populismo

I - A base do grupo golpista, em si era bastante heterogênea, por vezes divergiam em seus interesses de grupo. Mas tinham uma coisa em comum: a aversão ao protagonismo crescente que os movimentos sociais vinham adquirindo na participação das decisões dos destinos políticos do Brasil. Esse protagonismo de fato representava uma ameaça aos privilégios que estes setores conservadores e dominantes detinham, o que era fortalecido pelo "trabalhismo" em desenvolvimento constante no cenário político da época. Era primeiro preciso combater esse mal, do "trabalhismo" fez-se o "populismo", e o golpe civil militar veio encerrar esta prática nefasta, utilizada desde Vargas. As analises que se seguiram, apontaram este golpe como o Colapso do Populismo;

II - Reis faz uma análise da obra o "O colapso do Populismo" de Octávio Ianni, passando pela identificação, apogeu e crise do Populismo, a caracterização do espaço onde se manifestou e os seus desdobramentos. Reis por vezes chama a atenção para a análise de Ianni, onde este último aponta para a falta de consciência de classe dos trabalhadores e de como estes foram apenas marionetes dentro das disputas da esfera política. Chama atenção também para o "atraso" dessa classe no desenvolvimento da classe trabalhadora brasileira. Em consequência faz uma análise de como o PCB falhou em não conseguir se fazer ouvir pelas classes trabalhadoras não conseguindo construir uma política revolucionária, e como o seu erro de avaliação do momento histórico, levou a inevitabilidade do golpe militar;

Francisco Weffort e o Colapso da Teoria

Análise das teses de Franciso Weffort sobre a atuação das esquerdas e sua aproximação com a democracia populista. Weffort também daria enfâse ao "atraso" que marca a tradição da formação da consciência da classe operária brasileira.

Herança maldita

Critica sobre as interpretações que não se baseiam numa analise da formação histórica das tradições trabalhista e comunista. Tendendo sempre a considerar os processos a partir de um "marco zero" sem no entanto problematizar e perceber os traços residuais que as tradições de formação exercem sobre as atuais conjunturas.